sábado, 7 de abril de 2012

O bichao!


Era a minha segunda manha em Ubud. Acordei cedo e a caminho da casa de banho, algo chamou a minha atençao para o teto por cima do guarda-roupa ! Como vejo mal ao longe, aproximei-me mais e meti-me até em bicos dos pés para tentar perceber o que é que ali se encontrava. Demorei alguns segundos a perceber o que era e a recuar com as maos na boca tentando abafar um grito !

Por cima do meu guarda-roupa, na mesma divisao em que durmo, um bichao enorme (tipo vespa ou abelha, que eu nao sei a diferença !) e o seu vespeiro !!! Em muitos anos de Ribatejo, eu nunca, mas NUNCA vira um bichao daquele tamanho (tem à vontade o comprimento de duas teclas e meia do teclado do computador, seja la quanto isso for em centimetros !).

Assustada, imaginando-me a ser atacada por um batalhao de bichoes daqueles a meio da minha nao-tao-tranquila noite, corri a chamar a caseira, uma amorosa balinense, para que ela me tirasse o bichao e o vespeiro dali ! Agarrei nela pela braço dizendo-lhe « Come, come, I need to show you something ! », ao mesmo tempo que gesticulava para me fazer compreender, que o balinês nao é dotado para o inglês ! Assim que entramos na divisao eu apontei-lhe de braço muito esticado e olhos arregalados : « See ? », ao que ela me responde tranquilamente com um sorriso « Oh, no problem, I clean for you ! » ! (O QUE ?!?!- pergunto-me eu. Entao e sair daqui correndo em panico, nao ?!? Entao e ir buscar o insecticida mais forte que houver por estas bandas, também nao ?!?). Achando que era demasiada descontracçao para alguém que tivesse realmente percebido a gravidade da situaçao, voltei a agarrar-lhe no braço e puxei-a, ainda que a medo, para mais perto do bichao ! Nem uma pequena sombra de terror na cara dela ; a resposta foi a mesma « I clean for you ! ».

Sai para mais um dia de passeio com a quase-certeza de que quando regressasse ao meu quarto,  o bichao e o vespeiro continuariam là, que a caseira nao havia percebido a gravidade do problema, que se calhar bichoes daqueles nao matam balinenses mas que o português nao tem as mesmas resistências…

E quando voltei, escusado sera dizer que a primeira coisa que fiz foi dirigir o meu olhar para o teto por cima do guarda-roupa ! E ufff… nada de vespeiro, nada de bichao ! Afinal ela percebera tudo ! Estes balinenses têm uma capacidade incrivel de gerir com tranquilidade situaçoes de enorme gravidade !!! Sim, eu disse « situaçoes de enorme gravidade » !!!

E o episodio poderia ter ficado por aqui. Poder podia, mas nao era a mesma coisa :)

No dia seguinta acordo e, ou por automatismo, ou porque algo chamou a minha atençao, voltei a olhar para o tecto por cima do guarda-roupa ! Nao ! NAO !!! Nada de vespeiro, é certo, mas O BICHAO ESTAVA DE VOLTA !!!

Observei-o procurando desesperadamente pelo seu vespeiro e, ainda que com algum receio de ser por vingança atacada, senti uma ligeira tristeza ao aperceber-me do que o meu medo havia provocado ! Sem dor nem pudor, eu destruira (ou pedira para destruir, o que ainda é pior !) a casa do bichao ! A CASA ! E eu, estando longe de tudo o que me é familiar, até consigo imaginar o que isso é !

Com pena do bichao, resolvi nao chamar a caseira. Na minha mente, achei que uma vez que lhe haviamos destruido a casa ali, o bichao nao sentiria confiança para voltar a construir o vespeiro no mesmo sitio ! Sei là… digo eu…

Mas o bichao teimou !!! E nestes ultimos dois dias, ele sai e entra pelas grelhas em madeira trabalhada que existem por cima do guarda-roupa, atarefado com a reconstruçao do vespeiro que, devo dizer, avança a passos largos ! À noite, dorme agarradinho à casa semi-construida, como que protegendo-a. De dia, la vai ele… de volta ao trabalho !

Confesso que tive medo que me atacasse, assim por vingança sabem ?! Dizem que as abelhas (ou serao as vespas ?! nunca sei... ) atacam quem as atacar a elas, por isso porque nao esperar o mesmo do bichao ?! Mas parece que este bichao é diferente !

Durmo descansada (ok, nunca me esqueço de baixar a mosqueteira !), faço a minha vida tranquila (ok, vou sempre dando um olhito ao bichao e fecho a porta quando vou à casa de banho, nao va o bichao aproveitar essas alturas !), mas o bichao parece nao importar-se com mais nada senao com a construçao da nova casa !

O que o medo faz à gente !!! Achei que o bicho me poderia atacar e por isso ataquei-o primeiro ! E agora, com medo que ele me ataque por vingança, eu poderia, se nao fosse uma lamecholas com os bichos todos, voltar a ataca-lo novamente ! E ao que me parece, o bichao nao esta nem ai para mim!!!

Dou por mim a fazer o paralelo com situaçoes que vivo diariamente, nao com animais, mas com pessoas ! Quantas vezes ataco porque tenho medo de ser atacada ou magoada ou traida ? Quantas vezes deixo que seja o medo a tomar as rédeas da minha conduta ? Asseguro-vos que demasiadas vezes ! E quantas vezes nao sou também agredida pelo medo que sentem os outros ? A nossa vida seria tao mais bonita se vivessemos com menos medo e com mais amor !

Hoje deixo esta casa e o bichao ! Quem me conhece acredita quando digo que sairei daqui com o bichao no coraçao, que lhe agradeço por nao ter respondido com vingança, que estou grata pela liçao de respeito e de amor ! Que no fim de contas, ele e as osgas foram as minhas companhias nesta primeira semana em Ubud e que nao tenho absolutamente nada a apontar-lhes ! Que o bichao me perdoe « porque nao sei o que faço » agindo por intermedio do medo…

O que desejo é que o medo nao se apodere de nos, que as nossas atitudes e comportamentos nao se baseiem nesse medo e que trabalhemos toda a nossa vida para substituir esse medo inconsciente por um respeito e amor totalmente conscientes!

Muitos pediram que eu enviasse « luz » de Bali. É precisamente isso que vos envio hoje ! 

Gratidao*

3 comentários:

  1. É bonito de se ler ....mas e de se fazer??!!!

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  2. Oi amiguinha,
    há muito tempo que não falamos e que não nos vemos e decidi hoje vir ver o que andas a fazer...
    fiquei emocionada de ler o teu blog e perceber que estamos no "mesma" fase de vida, com as "mesmas" questões e as "mesmas" soluções. Ao ler o que escreveste tive a impressão de que poderia ser algo escrito por mim... se não fosse tão selvagem ;/ Fico feliz por ti e com o coração "inchado".
    Bom vento minha amiga! Continuas guardada no coração... Beijinhos

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