Era a minha segunda manha em Ubud. Acordei cedo e a caminho da casa de banho, algo chamou
a minha atençao para o teto por cima do guarda-roupa ! Como vejo mal ao
longe, aproximei-me mais e meti-me até em bicos dos pés para tentar
perceber o que é que ali se encontrava. Demorei alguns segundos a perceber o
que era e a recuar com as maos na boca tentando abafar um grito !
Por cima do meu guarda-roupa, na mesma divisao
em que durmo, um bichao enorme (tipo vespa ou abelha, que eu nao sei a
diferença !) e o seu vespeiro !!! Em muitos anos de Ribatejo, eu
nunca, mas NUNCA vira um bichao daquele tamanho (tem à vontade o comprimento de
duas teclas e meia do teclado do computador, seja la quanto isso for em centimetros !).
Assustada, imaginando-me a ser atacada por um
batalhao de bichoes daqueles a meio da minha nao-tao-tranquila noite, corri a
chamar a caseira, uma amorosa balinense, para que ela me tirasse o bichao e o
vespeiro dali ! Agarrei nela pela braço dizendo-lhe « Come, come, I need to show you
something ! », ao mesmo tempo que gesticulava para me fazer
compreender, que o balinês nao é dotado para o inglês ! Assim que entramos
na divisao eu apontei-lhe de braço muito esticado e olhos arregalados :
« See ? », ao que ela
me responde tranquilamente com um sorriso « Oh, no problem, I clean for you ! » ! (O QUE ?!?!- pergunto-me eu. Entao e
sair daqui correndo em panico, nao ?!? Entao e ir buscar o insecticida
mais forte que houver por estas bandas, também nao ?!?). Achando que
era demasiada descontracçao para alguém que tivesse realmente percebido a
gravidade da situaçao, voltei a agarrar-lhe no braço e puxei-a, ainda que a
medo, para mais perto do bichao ! Nem uma pequena sombra de terror na cara
dela ; a resposta foi a mesma « I
clean for you ! ».
Sai para mais um dia de passeio com a
quase-certeza de que quando regressasse ao meu quarto, o bichao e o vespeiro continuariam là,
que a caseira nao havia percebido a gravidade do problema, que se calhar
bichoes daqueles nao matam balinenses mas que o português nao tem as mesmas
resistências…
E quando voltei, escusado sera dizer que a
primeira coisa que fiz foi dirigir o meu olhar para o teto por cima do
guarda-roupa ! E ufff… nada de vespeiro, nada de bichao ! Afinal ela
percebera tudo ! Estes balinenses têm uma capacidade incrivel de gerir com
tranquilidade situaçoes de enorme gravidade !!! Sim, eu disse
« situaçoes de enorme gravidade » !!!
E o episodio poderia ter ficado por aqui. Poder
podia, mas nao era a mesma coisa :)
No dia seguinta acordo e, ou por automatismo,
ou porque algo chamou a minha atençao, voltei a olhar para o tecto por cima do
guarda-roupa ! Nao ! NAO !!! Nada de vespeiro, é certo, mas O
BICHAO ESTAVA DE VOLTA !!!
Observei-o procurando desesperadamente pelo seu
vespeiro e, ainda que com algum receio de ser por vingança atacada, senti uma
ligeira tristeza ao aperceber-me do que o meu medo havia provocado ! Sem
dor nem pudor, eu destruira (ou pedira para destruir, o que ainda é
pior !) a casa do bichao ! A CASA ! E eu, estando longe de tudo
o que me é familiar, até consigo imaginar o que isso é !
Com pena do bichao, resolvi nao chamar a
caseira. Na minha mente, achei que uma vez que lhe haviamos destruido a casa
ali, o bichao nao sentiria confiança para voltar a construir o vespeiro
no mesmo sitio ! Sei là… digo eu…
Mas o bichao teimou !!! E nestes ultimos
dois dias, ele sai e entra pelas grelhas em madeira trabalhada que existem por
cima do guarda-roupa, atarefado com a reconstruçao do vespeiro que, devo dizer,
avança a passos largos ! À noite, dorme agarradinho à casa semi-construida,
como que protegendo-a. De dia, la vai ele… de volta ao trabalho !
Confesso que tive medo que me atacasse, assim
por vingança sabem ?! Dizem que as abelhas (ou serao as vespas ?! nunca
sei... ) atacam quem as atacar a elas, por isso porque nao esperar o mesmo
do bichao ?! Mas parece que este bichao é diferente !
Durmo descansada (ok, nunca me esqueço de
baixar a mosqueteira !), faço a minha vida tranquila (ok, vou sempre dando
um olhito ao bichao e fecho a porta quando vou à casa de banho, nao va o
bichao aproveitar essas alturas !), mas o bichao parece nao importar-se com
mais nada senao com a construçao da nova casa !
O que o medo faz à gente !!! Achei
que o bicho me poderia atacar e por isso ataquei-o primeiro ! E agora, com
medo que ele me ataque por vingança, eu poderia, se nao fosse uma lamecholas
com os bichos todos, voltar a ataca-lo novamente ! E ao que me parece, o bichao
nao esta nem ai para mim!!!
Dou por mim a fazer o paralelo com situaçoes
que vivo diariamente, nao com animais, mas com pessoas ! Quantas vezes
ataco porque tenho medo de ser atacada ou magoada ou traida ? Quantas
vezes deixo que seja o medo a tomar as rédeas da minha conduta ?
Asseguro-vos que demasiadas vezes ! E quantas vezes nao sou também
agredida pelo medo que sentem os outros ? A nossa vida seria tao mais
bonita se vivessemos com menos medo e com mais amor !
Hoje deixo esta casa e o bichao ! Quem
me conhece acredita quando digo que sairei daqui com o bichao no coraçao, que
lhe agradeço por nao ter respondido com vingança, que estou grata pela liçao de
respeito e de amor ! Que no fim de contas, ele e as osgas foram as
minhas companhias nesta primeira semana em Ubud e que nao tenho absolutamente
nada a apontar-lhes ! Que o bichao me perdoe « porque nao sei o que
faço » agindo por intermedio do medo…
O que desejo é que o medo nao se apodere de
nos, que as nossas atitudes e comportamentos nao se baseiem nesse medo e que
trabalhemos toda a nossa vida para substituir esse medo inconsciente por um
respeito e amor totalmente conscientes!
Muitos pediram que eu enviasse
« luz » de Bali. É precisamente isso que vos envio hoje !
Gratidao*
É bonito de se ler ....mas e de se fazer??!!!
ResponderEliminaroi
ResponderEliminarOi amiguinha,
ResponderEliminarhá muito tempo que não falamos e que não nos vemos e decidi hoje vir ver o que andas a fazer...
fiquei emocionada de ler o teu blog e perceber que estamos no "mesma" fase de vida, com as "mesmas" questões e as "mesmas" soluções. Ao ler o que escreveste tive a impressão de que poderia ser algo escrito por mim... se não fosse tão selvagem ;/ Fico feliz por ti e com o coração "inchado".
Bom vento minha amiga! Continuas guardada no coração... Beijinhos